Fora do Corpo:
Rachel Carneiro
O ano era abril de 1987. Tinha meus 20 anos quando tudo começou. Dois dias após a morte da minha mãe, num acidente de carro, passei a morar sozinha. Andando pelas ruas da cidade, tive uma sensação estranha que me entorpecia todo o corpo. Estaria eu louca? Não! Deve ser apenas cansaço…
Cheguei em casa, me olhei no espelho. Além da minha aparência que sempre achei estranha, havia algo de diferente naquilo tudo. Ao tocar meu rosto, não me reconheci. Quer dizer, eu não sentia ele. Calma! Isso não pode estar acontecendo. Lá estava eu, parada, tentando imaginar o que estava acontecendo, o que era tudo aquilo. Minha mente esqueceu quem eu era? Estava assistindo a mim mesma. Eu tinha a sensação de não lembrar das coisas, pois eu não me apropriação dos acontecimentos. Tive medo de nunca mais conseguir se conectar com meu corpo novamente. Comecei a imaginar que estava em um sonho e quando acordasse tudo acabaria. Toques vazios. Não sentia fome ou sede. Quando saberia o que estava acontecendo? Sussurros atormentados me rondavam.
De repente, uma vontade avassaladora de ir até o cemitério, ver o túmulo de minha mãe e tentar me acolher um pouco. Ao vagar pelo cemitério, algo me chama atenção. Me paralisei. Senti um medo absurdo misturado com incredulidade. Era uma foto minha; simplesmente era eu ali. A data era a mesma do acidente que minha mãe sofrera. E como num súbito, fui relembrando vagamente o que acontecera. Tudo isso não foi um sonho… já não pertenço mais a este mundo. Eu estava morta!